terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

COMO FALAR SOBRE A VERDADE / A MENTIRA, DE FORMA DESCOMPLICADA: UMA REFLEXÃO AOS PAIS E EDUCADORES

Andréa Mascarenhas

AO FINAL, DICA DE HISTORINHA que contei para ensinar o valor VERDADE aos filhotes. 

Pode ser usada por pais e educadores, de modo geral, com crianças a partir de 6 anos.
Na educação de nossas crianças, muitos temas não são simples de serem abordados. Alguns por serem delicados; outros por parecerem complexos demais... Mas, que tal abordá-los de uma forma descomplicada e natural como o é o desenvolvimento infantil?

Um desses temas que, muitas vezes, deixam os pais “de cabelos em pé”, é a mentira. Muitos pais ficam ansiosos e perdidos no momento de lidarem com as mentiras contadas pelos seus filhos. Escrevi algo sobre, no momento em que refletia e procurava oferecer dicas a outras mães.

Antes, gostaria de ressaltar que a “mentira” vai sempre estar presente em alguma fase da criança, faz parte de seu desenvolvimento natural...

Vamos conversando... É importante observar alguns pontos:

1.  Trate como se desconhecesse a palavra ‘mentira’. Não a use quando o seu filho apresentar tal comportamento. Nada de rotular a criança como mentirosa (na maioria das vezes, quando a fase chega, a criança nem sabe o nome dessa coisa ainda). Ela “mente” porque é natural fantasiar... A fase pode durar um bom tempo. É a pura expressão de criatividade ou de sentimentos escondidos e que a criança ainda não consegue expor de outra forma.

2.  Aos pais de crianças pequenas, digo apenas: “Relaxa!”. Crianças pequenas nem sabem separar as fantasias da realidade. Elas contam histórias e relatam casos como se eles tivessem acontecido, de fato; misturam também os sonhos aos fatos reais... (No máximo, eu brincava com suas histórias e invenções: “Hm... Acho que você sonhou isso, não?” ou: ”Que legal essa história que você está contando... Você inventou isso tudo? :o ” )

3.  Até aproximadamente 7 anos, o mundo lindo da fantasia vai fazer parte da vida da criança. Nada de alarde! Porém, como pais, claro que nos preocupamos. Afinal, a verdade é um valor de importância indiscutível. Uma pessoa que aprende a falar a verdade aprende também outros valores, a exemplo da honestidade, da justiça (é impossível ser honesto sem ser verdadeiro ou vice-versa). Se a “mentira” contada for algo desagradável, de posse da “verdade”, você pode ir dizendo: “Oh! O que podemos fazer para que essa história seja diferente?”; “Você contou uma parte da história... E aquela outra parte em que acontecem tais e tais coisas? Vamos falar do jeitinho que aconteceu?”; “Acho que você se atrapalhou um pouquinho. Quer contar de novo? Eu te ajudo!” (E assim, os pais podem ir levando a criança em direção às “verdades”, dando a “outra versão” da história e dos fatos). E, em vez de falar da mentira, os pais começam a ensinar a verdade: “Olha, quando falamos alguma coisa do jeitinho que ela aconteceu chamamos isso de verdade; falar a verdade, falar as coisas do jeito que elas aconteceram é muito bom, porque assim a gente entende melhor as coisas...”

4.  Evite demonstrar preocupação, tristeza ou decepção com a criança ao se deparar com casos de “mentira”. Isso pode gerar sentimentos de culpa, uma culpa que a criança ainda não tem maturidade para entender e assumir, uma culpa que não é da criança, de fato.

5.  Após os seis anos, os pais podem ir ensinando à criança sobre a verdade (se ela já tem contato com a verdade SEMPRE, através DO EXEMPLO dos pais e cuidadores, tudo pode ser muito simples...). Acho seis anos uma fase boa pra começar a abrir o jogo sobre determinados valores... Não que após essa fase não seja permitido que a criança “minta”, ainda. Normal que aconteça. Esteja atento/a à frequência com que acontecem os casos de mentira e o porquê de a criança estar usando a mentira. Converse sempre com ela sobre a importância de falar a verdade...

6.  O problema começa a aparecer quando a ‘mentirinha’ acaba gerando situações desconfortáveis ou desagradáveis para as pessoas. Os pais precisam estar atentos e buscarem o que está atrás da mentira. Aja na CAUSA. Seu filho mentiu para agradar alguém? Ensine-o que nem sempre precisamos agradar as pessoas, que elas também precisam aprender a respeitar os nossos gostos e decisões... Seu filho mentiu para evitar alguma situação que ele não se agrada? Ensine-o a se sair de outra forma; ensine-o a expor a sua própria opinião sem medo; mostre-lhe as várias alternativas à mentira... Dialogue, dialogue, dialogue...

7.  Enfim, se a criança mente por medo, é VOCÊ quem precisa mudar. Não tenha receio de refletir sobre a sua postura. Será que você não aboliu as palmadas, mas ainda usa de um tom grosseiro, ameaçador que faz seu filho estremecer por dentro, mesmo sabendo que não vai apanhar? Será que mesmo sem palmadas, você não está lançando aquele olhar assustador e humilhante que talha em segundos o coraçãozinho de seu filho? Será que o castigo que você ainda defende não ensina a seu filho mentiras muito piores do que a que ele contou? Como é a expressão do seu rosto quando, por exemplo, um copo cai das mãos de seu filho e quebra em mil pedacinhos no chão? E o que você lhe diz quando descobre que ele quebrou o brinquedo novo, aquele que custou mais caro do que o seu armário de cozinha? Reflita, reflita, reflita...

Bem, vamos à historinha?

Ela é BEM antiga; eu a ouvi há décadas. Procurei-a na internet, com o propósito de contar para meu primeiro filho quando ele fez uns 7 anos. Fiz várias adaptações (perdoe-me o autor), só tentei aproximar a linguagem da história do universo das crianças, tornando-a mais animada e atraente.


(Excelente contribuição de Esopo nesse texto, mas não recomendo ler o original, porque vem acompanhado do termo/rótulo ‘mentiroso’; portanto, torna-se inconveniente para a criança; pode gerar medo, em vez de conduzi-la à reflexão...)

Fiz algumas adaptações:

O Pastor e o Lobo

Era uma vez um pastorzinho,
bem engraçadinho,
que andava a cuidar de suas ovelhas
lááááááááá em cima de um morro...

Mas ele muito, muito gostava
de brincar com as coisas que falava.
E também gostava
de dizer coisas que não estavam acontecendo.
Ele inventava, inventava...
E adoraaaaaaaaava
enganar todo o mundo...

Um dia, o pastorzinho desceu o morro
e gritou com voz de aflição:
- Socooooooorro!
O lobo está atacando as minhas ovelhas!...
Olhem o lobo! Ele está atacando as minhas ovelhas!...

Dez vizinhos,
que eram seus amiguinhos,
subiram o morro correndo, correndo,
para ajudar o pastorzinho
com seus animaizinhos,
para não deixar o lobo
atacar os bichinhos...

Chegaram ao lugar,
nem sinal de lobo.
E lá no morro,
ninguém mais pedia socorro...
Só encontraram o pastorzinho
rindo, rindo sem parar...

No outro dia,
o pastorzinho repetia
e gritava novamente,
e a cena se repetia.
Só que algumas pessoas, muito espertas,
não foram mais lá.
Só cinco vizinhos
subiram o morro
para ajudar o pastorzinho...

No outro dia,
assim que o Sol nasceu,
ele repetiu pela terceira vez a mesma coisa.
E novamente, gritou:
- O lobo está atacando as minhas ovelhas!...
Olhem o lobo!
Ele está atacando as minhas ovelhas!...

Um vizinho, coitado,
levantou da cama descabelado,
e muito preocupado,
subiu aquele morro,
ainda com seu gorro...
E de noooooovo
não tinha lobo.

Nunca, nunca tinha lobo algum.
E sempre, sempre
o pastorzinho só fazia rir
e rir bem alto,
achando bobas as pessoas
que acreditavam nele...

Um dia o pastorzinho
desceu de novo aquele alto morro
gritando e gritando:
- Socoooooorrro!
Olhem o lobo…
Olhem o lobo…
Olhem o lobo!...
Ele está atacando as minhas ovelhas!...

Desta vez,
ele falava sério,
beeeeeeem sério!
Ele não sorria,
só se escondia,
com medo daquele bicho grandão,
forte e mauzão.

Mas ninguém deu importância...
Todos os vizinhos,
até seus amiguinhos,
acharam que não tinha lobo algum
e que aquele pastorzinho
só queria rir, rir
e depois fugir
de todos eles de novo...

E essa história termina assim.
Eu nunca fiquei sabendo o fim;
só sei que as ovelhinhas,
pobrezinhas,
tiveram que correr,
correeeeeeeeer pelo morro,
fugindo daquele lobo
grandão,
forte e mauzão.

Fiquei sabendo também
que nunca mais
o jovem pastorzinho
inventou coisas que não existiam.
Dizem que ele foi até seus vizinhos
e pediu desculpas direitinho,
prometendo que nunca mais
ia fazer ninguém de bobinho...

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