quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Bater em criança? Sempre foi assim...

Andréa Mascarenhas


Quem nunca parou pra refletir porque fazemos isso ou aquilo, porque nos vestimos dessa ou daquela forma, não é capaz de compreender como somos movidos por hábitos e costumes, e como, a todo o momento, estamos nos deixando influenciar por comportamentos e atitudes do outro, principalmente aqueles adquiridos de geração a geração.

De forma consciente ou não, nossa vida é influenciada, em todos os âmbitos, por esses costumes. E a formação destes em um grupo social se dá de forma paulatina, ao passo que exerce influência no meio e nas pessoas. Aos poucos, vão moldando os modos de um povo, conduzindo a sua forma de ver, de pensar, de fazer e até de ser.

Os costumes vedam os olhos das pessoas, impedindo-as de enxergar além, ou de visualizarem as opiniões do outro ou de outro grupo social. Não raro nos flagramos estranhando o modo de vida de outras pessoas, percebendo e criticando outras posturas, outras formas de ver, de viver e de conviver socialmente.

Se fôssemos fazer uma lista de atitudes e comportamentos que fazem parte de nosso dia-a-dia, dos mais simples aos mais complexos ou comprometedores, teríamos uma página nada pequena, desde a forma de nos vestir, aos nossos hábitos alimentares e à forma de nos comportarmos em sociedade.

Certa vez eu estava no trabalho com algumas colegas. Alguém nos ofereceu bananas no momento do lanche. Enquanto comíamos, uma das colegas mordeu o primeiro pedaço da fruta e procurou por uma lixeira, onde pudesse jogar fora esse pequeno pedaço. Eu perguntei a razão pela qual ela queria jogar o pedaço da fruta no lixo e ela me respondeu: “Ué, não jogamos o primeiro pedaço da banana fora?”. Eu, tranquilamente, comi a minha fruta por inteiro. Apesar de bem madura, ela não tinha nenhuma partícula estragada ou que tivesse ficado exposta a insetos e sujeiras, precisando ser depositada ao lixo. Deduzi que essa era mais uma das nossas atitudes impensadas, apesar de ser uma pequeníssima coisa, nada prejudicial, apenas um detalhe entre tantos costumes que praticamos conosco e com o outro.

O que entra em questão aqui não é a nocividade da atitude, mas a influência do hábito no comportamento e no modo de vida das pessoas. Ao questionar o porquê de fazermos algumas coisas dessa ou daquela forma, a resposta, na maioria das vezes, é: “Sempre foi assim...”

Porém, devo enfocar que atitudes movidas pelo hábito, muitas vezes, são prejudiciais. E este é um aspecto que merece destaque aqui: a força dos costumes e hábitos na propagação do ato de bater em crianças, comportamento danoso e sem sentido algum paro o ato de educar. Ou seja, além de tantos comportamentos movidos pelo hábito, mas sem nenhum impacto na vida social, existem também aqueles que se constituem em grandes erros. E, levando em consideração que o ato de bater em crianças acontece apenas pelo costume, faz-se necessário destacar a necessidade de se refletir sobre tal prática, de forma intensa, clara e contínua.

É preciso mudar a forma de pensar para mudar muitos tipos de comportamentos que apresentamos, dentro de um ou vários grupos sociais do qual fazemos parte, a começar pela família. É possível traçar novos caminhos e encontrar respostas às interrogações que, na maioria das vezes, estão inativas.

Educar crianças batendo: Não há justificativa provável para tal prática!

A infância é a fase da vida em que mais se aprende por exemplos e comportamentos do que por palavras e discursos. O exemplo é, pois, fundamental na educação dos filhos, e a forma de tratamento dada aos filhos pelos pais é um dos aspectos que definem a direção do comportamento da criança, quase sempre. Nessa perspectiva, o diálogo, a atenção e a interação são o caminho mais eficiente, pois envolve sentimentos e valores como o amor, compreensão e o respeito.

Se um pai diz a seu filho que não se deve bater no irmãozinho, no coleguinha ou em outra pessoa, mas ele o faz no próprio filho, as referências da criança ficam confusas. Uma série de paradoxos entra em campo aqui.

Não é fácil mudar o modo de ser, de pensar e de agir, dentro de um contexto histórico tão influente, consideradas as convicções e certezas proporcionadas pelo hábito e pela cultura. As pessoas precisam adquirir consciência do poder que elas têm de transformação. Repensar, refletir, criticar sua forma de agir e pensar é um dos passos importantes a serem percorridos nesse caminho.


Andréa Cristina Mascarenhas Nascimento dos Santos

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Práticas usadas pelos pais no disciplinamento dos filhos

Andréa Mascarenhas


Os estudos revelam que as práticas educativas diferem nos diversos grupos sociais e tempos. Pais, mães e educadores, de forma geral, questionam-se sobre formas de disciplinar os filhos. Pesquisadores observam que algumas famílias são capazes de “funcionar” com certa facilidade, têm filhos tranquilos, bem desenvolvidos e resolvidos emocionalmente; enquanto outras, de mesma situação econômica e social, vivenciam problemas de toda ordem. De acordo com Zamberlan (2003), a família continua a ser o fator norteador do desenvolvimento da personalidade da criança. Porém, quando se fala em desenvolvimento infantil, muitos cuidadores não fazem ideia de sua responsabilidade nesse processo. A criança não se desenvolve sozinha, ela é guiada por exemplos e atitudes dos adultos. As práticas educativas parentais têm uma forte influência nesse desenvolvimento.

Lubi (2003) explica que o desenvolvimento infantil está claramente vinculado ao contexto familiar, às vivências e às práticas educacionais. Essas, por sua vez, constituem-se num conjunto de estratégias, com o objetivo de adquirir obediência e respostas dos filhos a determinadas solicitações de seus pais. Essas práticas visam orientar, educar, instruir e controlar o comportamento dos filhos, a fim de atingir condutas consideradas adequadas pela sociedade.

Badinter, 1985, afirma que as práticas educativas têm relação com a forma pela qual foi vista a criança durante séculos: como uma propriedade privada dos pais e da sociedade; como um adulto em miniatura; e como força do mal, julgada e condenada segundo as normas dos adultos.

Ingberman (2001) relaciona alguns aspectos do comportamento familiar que colaboram para a adequação de seus membros. O primeiro é a comunicação e se refere a comportamentos verbais ou não verbais expressos por seus membros. O segundo aspecto refere-se à iniciação da disciplina, que envolve interação entre pais e filhos, incluindo a aceitação e/ou confronto com as regras. Quando os pais não sabem lidar com a criança, dão margem ao aparecimento de problemas de ordem disciplinar, prejudicando o bom desenvolvimento de seus filhos e gerando rupturas na prática da disciplina, colocando a criança em situação de risco. O terceiro aspecto refere-se aos papéis de cada membro dentro da família, contribuindo para a harmonia da mesma.

O quarto aspecto envolve a liderança que os pais devem exercer no grupo familiar, uma liderança democrática, que combine paternidade com autoridade e busque o bom desenvolvimento emocional de todos. Ainda dentro desse aspecto, Ingberman lembra que a característica dos pais autoritários é exigir obediência rigorosa da criança sem lhe dar explicações, e que os pais “com autoridade” impõem limites, mas são consideravelmente mais flexíveis, mantém o diálogo como ferramenta importante na relação e dão muito carinho aos filhos. Gottman e Claire (1997) dizem que crianças que crescem sem limites e sem orientação de seus pais apresentam dificuldades de concentração, em fazer amizades e em relacionar-se com seus pares. Afirmam, ainda, que as crianças precisam de limites seguros e saudáveis, e que a nossa disposição em colocar esses limites transmite amor.

Os conflitos constituem-se no quinto aspecto e podem ser benéficos, ou não; dependendo de como são tratados, podem conduzir ao equilíbrio ou desequilíbrio emocional. O sexto aspecto ressalta que é comum a manifestação da agressividade no ambiente familiar, mas a afeição deve estar acima desse comportamento, e cabe aos pais gerenciar tais comportamentos. O sétimo diz respeito à harmonia dos pais, gerando esforços para a conquista de objetivos comuns. O oitavo e último aspecto refere-se à autoestima e apresenta a importância de atitudes dos pais para com seus filhos, destacando o interesse por seus sentimentos, sonhos e realizações. Enfatiza, ainda, os danos causados pelos maltratos à vida da criança.

Lubi classifica as práticas educativas em coercitivas e não-coercitivas. Embora ambas têm o mesmo objetivo, são muito diferentes e responsáveis por diferentes efeitos.

As estratégias de força coercitiva, segundo Alvarenga (2001), são caracterizadas pelo uso da força e da punição, seja física ou psicológica. Entre as formas de manifestação da força coercitiva estão os castigos físicos, a privação do afeto e as ameaças. A criança controla seu comportamento em função das reações dos pais. A força coercitiva produz fortes emoções negativas, tais como medo, raiva e ansiedade, que interferem negativamente na capacidade da criança entender seu erro. Portanto, as práticas de força coercitiva não beneficiam o aprendizado das regras e padrões sociais. Frequentemente são citadas as relações entre práticas de caráter coercitivo e problemas de comportamento, entre eles estão a agressividade, desobediência etc.

De acordo com Weber, Viezzer e Brandenburg (2003, p. 499), para muitos pais a punição física é a melhor forma de disciplinar os filhos. Isso acontece porque a força física paralisa a ação, levando a criança a mudar de comportamento momentaneamente. A imediata obediência traz benefício para os pais, aumentando a probabilidade de continuarem a utilizar tal prática em outras situações. Os pais, explicam as autoras, precisam aprender outras formas de disciplinar seus filhos, que garantam a mudança de comportamento duradoura e adequada, mantendo uma dinâmica familiar, que priorize o afeto, o comprometimento e a autoridade democrática.

As estratégias de força não-coercitiva envolvem a utilização da disciplina positiva (uso de reforçadores), o estabelecimento de regras (limites), com uma supervisão constante, incentivo à autonomia e fortalecimento da autoestima da criança.


Capítulo 1.3 de meu TCC 'RELAÇÕES INTERPESSOAIS E A APRENDIZAGEM: O IMPACTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO DESEMPENHO ESCOLAR', disponível em: http://www.4shared.com/office/0KNzH8bW/TCC_-_Relaes_interpessoais_e_a.html